Todos os anos existe um dia no qual a minha reduzida família se reúne com o propósito de enviar livros para África. E isto não é brincadeira. E nem sequer é dia com marca no calendário. Não é premeditado, simplesmente acontece. É feita uma vistoria por todos os livros empoeirados que repousam, à anos, em prateleiras já petiscadas pelo caruncho (tenho a dizer que adoro a palavra petiscar, mas ao que parece engorda). E (re)encontrei alguns livros dos quais não sabia pouso e que acabaram por marcar a minha infância.
Um deles é da autoria do mítico Júlio Isidro e chama-se Histórias do Tio Julião, um conjunto de histórias para crianças escritas pelo deslumbrante apresentador. O meu pai ofereceu-mo uma vez pelo Natal, deveria eu ter uns 8 anos, e lembro-me de ficar fascinada com os ilustrações dos contos e com a capa em tons de verde e estrelas e balões animados por expressões humanas. Voltar a tocar nesse livro foi absolutamente delicioso, e despertou-me memórias muito bonitas. E felizes, algo raro, já que em mim o saudosismo acaba sempre (ou quase sempre) em choro. Patético. Mas inevitável.
Adquirido na altura em que os meus pais pertenciam ao Círculo de Leitores, Maravilhas do Mundo foi, talvez, o livro que mais tempo me ocupou os dias quentes das férias de Verão, nas quais era obrigada a passar os habituais 15 dias na Praia de Buarcos, na Figueira da Foz. De tanto lhe dar uso destruí-lhe a lombada, e as páginas já mal se seguram. Começava com as 7 maravilhas da Antiguidade e prosseguia com uma descrição dos lugares e monumentos a visitar, organizados por continentes. Era o melhor meio de transporte, que me levava a viajar mundo afora, a locais diferentes, todos os dias. Tinha particular fascínio pelo Alhambra em Granada e os templos de Angkor no Cambodja, e o único monumento português que constava da lista era o Mosteiro da Batalha.
Confrontei-me depois com a colecção de 15 livros da Rua Sésamo, coloridos e enebriantes, uma colecção feita pelo meu pai ao longo de mais de um ano, comprando um novo volume todos os meses e sempre no mesmo quiosque. E em cada um desses 15 dias foi sempre dia de festa. E cada uma dessas festas prolongava-se por 30 dias, nos quais o livro era por mim escrutinado ao pormenor, ao ponto de lhe conhecer todas as formas e cores e saber de cor todas as linhas.
Algum tempo depois alguém muito especial me ofereceu o primeiro livro com mais de 50 páginas que eu tinha lido até então. Chama-se Senhor Deus, esta é a Ana (eu, que quase podia escrever hoje um livro com o mesmo título, se tivesse sido abençoada com o dom da palavra escrita) da autoria de Fynn. Ou como ver Deus através de uma lanterna mágica e da candura das brincadeiras de criança. Ficou guardado junto à cama para voltar a ler um dia destes. Depois vou oferecê-lo a alguém que o vai apreciar tanto ou mais do que eu.
Estes livros acabaram por não ir parar a África. Há partes da minha história que eu gosto de conservar junto a mim.
5 comments:
Aqui está uma reflexão muito pertinente para mim, que também sofro do síndrome de acumulação crónica no que toca a livros com valor sentimental. Fazer escolhas torna-se muito complicado, mesmo quando o que está em causa é o espaço vital dentro de casa, mas não são essas mesmas relíquias que transformam as quatro paredes num verdadeiro lar ;)?
oh por buddha e todos os santinhos catarina manuela eu também tenho esse livro do tio julião!!!!!!!!! eu não me lembrava disso! presumo que esteja numa das milhentas caixas que eu acumulo na garagem. era fabuloso! os desenhos eram uma coisaaaaa! acho que foram os meus tios da figueira da foz que me deram juntamente com umas jardineiras às riscas (ias amar) que me serviu anos mais tarde para me mascarar de palhaça (não é que precise de muito).
pois, o angkor wat é bem sonho, já sabes do meu fascínio por essa zona e afins... dai realmente poderes escrever o livro! Deus, esta é a Ana! é muito bom!
não tiveste uma colecção de livros da disney que trazia cassetes (com as quais o meu irmão "fazia obras pós camiões" já na altura)? e os da anita? e do tintin? (eu ser hiper fã do tintin!)
Sem dúvida Maria. Sem elas é como viver em ambiente estéril. E estes livros são apenas os de criança. Depois começei a ler livros "a sério". E o valor sentimental que lhes imprimimos cria laços tão grandes que há livros que se tornam parte de nós e da nossa história. São preciosos:)
Não me chaes Catarina Manuela que eu não gosto, sabes bem.E não me digas que também tens o livro do Tio Julião. Tu e eu estávamos destinadas. Só pode. E o meu está também numa caixa na garagem. Os desenhos eram magníficos. Lembro-me que algumas histórias me metiam medo. Só para veres o quanto eu já era medricas na altura. E essas jardineiras deviam ser um fartote.
Tive essa colecção da Disney sim senhora e ainda hoje conservo a cassete do Livro da Selva com as vozes do Mogli e do Bagera. Lembras-te? Do Tintin tive poucos mas tive os do Asterix e os da Anita, meu deus ... amava-os de paixão. Ainda tenho o "Anita e a festa de anos" e o "Anita na feira da ladra".
O livro é para ti ;)
eu sei que não gostas! :P
não me gozes! a sério!?!?! oh! que lindooooooooo!!! isso é mesmo lindooo!!! eu sei que estou a parecer pirosa, mas a sério, isso é tão lindooo!!!
São essas que nos fazem querer voltar a casa no fim de uma viagem, Maria. There's no place like home.
Oh Ana... Bahhhh!!! Vamos mas é para o Tropical dar às pessoas um motivo para falarem :)
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