Sunday, December 18, 2005

Quem?......Ninguém...

Quando se acorda é pior. Parece que o mundo desaba. A dor de cabeça lateja como um eco, inaudível, insuportável. É a ressaca depois da noite, das noites, passaram, hoje é tudo diferente, deturpado, ou isso seria ontem? Acabo por me sentir confusa. É ao olhar em volta que sufocamos, está tudo oco, os passos mascaram silêncios que, caso contrário, matam aos poucos, ou não se torna o caminhar nada mais que uma morte lenta, arrastada? Se nos encostarmos à parede, sem emitir ruídos, quase que o ouvimos chamar. Vencidas as resistências (somos humanos, nascemos fracos ou assim nos acabamos…) é vê-las jorrar quentes pela face, as feições tremem, parecem tiques nervosos, surge o rubor e os olhos ficam mais verdes. Os meus ficam bem verdes. Mais verdes só mesmo quando o sol lhes bate de frente, mas aí eu não consigo ver. É o que me contam.
Acordo já sem sol, pelo meio ele nasceu (lembro-me de fechar os olhos) e morreu, a ponta do nariz gelada, por fora do edredon, tapo a cabeça por completo. Não quero sair lá para fora, lá fora não há nada, não há ninguém… ninguém… ninguém… e eu continuo a ouvir vozes. E a voz de ninguém? Essa imagino nunca a ter ouvido. É tudo uma fantasia, se calhar nunca existiu, e eu criei filmes na minha cabeça.
Sinto o cheiro do café de ontem. Adormeci com a vela acesa, devia estar exausta. Espreito lá para fora e está o meu reflexo a olhar para mim no espelho. Aiiiiii… aquela pessoa está fixa em mim, aquela pessoa, eu sei que não sou eu. Se ela sou eu juro que perco a vontade em me levantar. A televisão ligada, o cd em repeat mode… Khonnor? Se calhar mudo o cd. Depois penso que não me consigo mudar com tanta facilidade. Conheço-me assim desde que me conheço. Talvez só depois de uma boa noite de sono. E afinal, amanhã já é segunda-feira, certo? Podia continuar eternamente domingo, podia permanecer anestesiada indefinidamente. Um beliscão ao acordar e tudo passa. Será? Vou-me começar a beliscar todos os dias, pode ser que não se torne tão difícil. Pode ser que todas as manhãs comece por ser terça, ou quinta. As quintas não me parecem tão difíceis, quase que se tornam mais fáceis de suportar. Quase que são fáceis, ou assim se tornam à medida que as horas se arrastam. À noite tudo parece mais livre, à noite o meu mundo muda de tonalidades, adquire tons quentes. À noite tudo é mentira, eu sei, erguemo-nos na manhã seguinte carregados de dúvidas e com a cabeça à roda. O que é que aconteceu mesmo? Quem? Ninguém… ninguém… Ahhhh… então foi isso. Penso que agora começo a perceber…

1 comment:

André Morais said...

Sim, o edredon, aquele que aquece e proteje o nosso mundo do real, impenetravel imaginário que desgasta e queima o miolo e nos leva a passear para as montanhas do sonho e da tranquilidade ou para os mares incertos da insegurança obscura e fria, mas que o edredon aquece e proteje de todos aqueles que não o povoam.
Não haveria de haver tardes, naqueles dias em que as manhãs são frias e a vida lá fora não apetece. E o abraço seria suficiente para alimentar todos os sonhos e espantar todos os males.
No meu edredon em branco de neve, rechedo de penas, podes entrar sempre que quiseres.